A fé sem ação é comodismo disfarçado
Será que, se você não orar, deus deixará de agir? Será que o criador do universo depende da sua oração para acabar com a fome, com as guerras, com as injustiças que assolam o mundo? É mesmo possível que um ser divino, supostamente soberano e onisciente, esteja à espera da sua devoção diária para finalmente intervir?
Essa é uma pergunta que precisa ser feita com coragem. Muitas vezes, ensinamos que a oração é o caminho para tudo, e de fato ela pode ter seu valor como ferramenta de introspecção, alívio emocional e conexão espiritual. Mas ela jamais pode substituir a ação.
Ao invés de simplesmente agradecer por aquilo que recebemos, o alimento, o abrigo, o trabalho, talvez devêssemos aprender a perguntar: quem realmente tornou isso possível? Quem plantou, quem construiu, quem lutou, quem trabalhou? A fé, quando nos desconecta da realidade e da responsabilidade, deixa de ser virtude e se torna fuga.
Não basta acreditar que tudo está nas mãos de deus. O mundo é moldado pelas mãos de quem age. Sem esforço humano, não há produção, não há sustento, não há transformação. Não haverá alimento na mesa se não houver trabalho. Não haverá justiça se não houver denúncia. Não haverá mudança se não houver movimento.
Esperar que deus resolva tudo por nós é infantilizar a espiritualidade. É mais confortável terceirizar para o divino aquilo que exige sacrifício, disciplina, engajamento. Mas a verdade é simples: se você não agir, nada acontece. E não se trata de ausência de fé, trata-se de maturidade.
É urgente repensar o que temos chamado de “fé”. Se ela não nos impulsiona à responsabilidade, ao compromisso e à ação concreta no mundo, talvez não seja fé, mas conformismo. E o conformismo, quando se veste de espiritualidade, se torna ainda mais perigoso, porque acomoda consciências sob a ilusão de que “deus proverá” mesmo quando nós mesmos nos negamos a prover.
Não somos tão especiais a ponto de achar que o agir de deus depende de nós. Mas também não somos tão isentos a ponto de achar que nossa omissão não tem consequências. O mundo está como está, em grande parte, porque muitos oram, mas poucos agem.
A fé não deve nos afastar da realidade, e sim nos responsabilizar por ela. O que muda o mundo não é o discurso, nem a oração vazia, é a ação consciente.
Cleiton dos Santos
Comentários
Postar um comentário