Não Busco Mérito, Busco Sentido


Hoje me questionaram. Perguntaram como posso, em um momento, duvidar de deus e, em outro, exaltar sua criação. Como posso colocar em xeque a existência histórica de Jesus e, logo depois, falar com entusiasmo sobre a profundidade de seus ensinamentos. Como posso criticar duramente a religião institucionalizada e, mesmo assim, demonstrar atitudes que muitos associam à espiritualidade ou até à religiosidade.

Confesso que essas perguntas me atravessam, mas não como ofensas, e sim como reflexões legítimas. Porque eu mesmo me pergunto tudo isso. E justamente por me permitir questionar, é que continuo caminhando. Só pode realmente me julgar quem me conhece profundamente. Quem anda comigo nos silêncios, nas dúvidas, nos dias em que a fé parece distante e nas noites em que a busca por sentido me tira o sono. Quem vê o que penso quando ninguém está olhando. Quem entende que minha jornada não é feita de certezas absolutas, mas de perguntas honestas. Eu não sou dono da verdade, estou em busca dela. E essa busca é, por si só, uma forma de fé.

Acredito que deus não se ofende com perguntas. A dúvida, ao contrário do que muitos pensam, não é inimiga da fé, ela é sua aliada. A ciência, que tanto admiramos por sua capacidade de investigar, de comprovar, de transformar o mundo, também nasceu da dúvida. E se deus existe, se ele é tudo o que é verdadeiro, então certamente está presente também no raciocínio, na lógica, na inquietação que move o pensamento humano. A fé cega pode gerar fanatismo, mas a fé inquieta, que não se acomoda, pode gerar sabedoria. É no contraste entre crer e duvidar que eu sinto, paradoxalmente, estar me aproximando do Criador.

Eu não busco deus por interesse. Não O procuro por medo, nem como barganha por bênçãos ou recompensas materiais. O que eu busco são virtudes. Busco aquilo que ninguém pode me tirar: a paz interior, a lucidez, a compaixão, a empatia, o desejo de ser uma pessoa melhor para mim e para os outros. Não faço o bem por receio de punição divina, mas porque acredito profundamente na moralidade que transcende religiões e códigos. Acredito que o ser humano é capaz de escolher o bem pelo bem, não por medo do inferno, nem pela promessa do paraíso.

Vejo Jesus como um símbolo poderoso. Não me importo se ele foi ou não uma figura histórica no sentido estrito, porque sua mensagem carrega uma força que vai além dos registros e das provas. Jesus, para mim, representa um ideal elevado, alguém que desafiou estruturas injustas, que se posicionou ao lado dos excluídos, que ensinou o amor ao próximo acima da lei, que viveu (ou foi imaginado como alguém que viveu) com coragem, entrega e compaixão. E isso, por si só, é profundamente inspirador. Assim como tantos outros pensadores, líderes e figuras humanas que transcenderam seus próprios tempos.

Não sou um religioso tradicional, mas tenho fé. Não sigo rituais fixos, mas cultivo silêncio, escuta, contemplação. Não carrego certezas absolutas, mas tento caminhar com honestidade. Vivo em conflito, sim, mas é nesse conflito que florescem as perguntas mais bonitas, as reflexões mais sinceras, os encontros mais verdadeiros.

Então, se às vezes falo como quem acredita e, em outras, como quem duvida, é porque minha espiritualidade não está pronta. Ela está em construção, como eu mesmo. E talvez seja exatamente isso o que torna essa busca tão humana.

Cleiton dos Santos 



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